CASSETES
Sempre do mesmo
Julgo saber que, pelo menos em
tempos idos (não muito idos) se lecionava retórica nos cursos de direito.
Todos somos testemunhas dos
excelentes resultados obtidos com tal formação por alguns. Para exemplificar,
lembramos-nos logo do super ministro das decisões irrevogáveis.
O homem era (ainda será
certamente) um verdadeiro artista nas entoações, nos ênfases. Com ele, os
discursos ganhavam contornos de eloquência, de limpidez. De tal forma que todos
acreditámos que a decisão irrevogável era garantidamente irrevogável.
Confronto-me agora com a dúvida
se não será lecionada nos cursos de comunicação social uma cadeira sobre a arte
da omissão.
A dúvida ressalta (pela enésima
vez e pelas enésimas razões) sobre uma análise (para os que saibam a fronteira
entre análise jornalística e informação, apelo a eventual correção) publicada
na edição impressa do Público de hoje.
O tema: eleições na Alemanha.
Para além de em determinada
passagem (que cito em seguida) ter ficado demonstrado que demografia não é
garantidamente matéria lecionada nos cursos de comunicação social (ou então a
jornalista em questão teve dificuldades de perceção). Veja-se o que escreve: Houve também um choque, a entrada forte no Parlamento da Alternativa para
a Alemanha (AfD), que capitalizou com medos e descontentamentos vários,
sobretudo com a entrada no país de mais de 800
milhões de refugiados, fl irtando com polémicas e retórica de extrema-direita
— chegou a 13,3% dos votos”[1]
Ficámos a saber que o Die Linke, (5.º
partido mais votado), foi pura e simplesmente omitido (rasurado) quer do
articulado, quer mesmo da infografia que ILUSTRA o texto.
Na análise de outra analista
ficámos a saber que esta nada aprendeu com a derrocada dos arcos governativos
em Portugal, pois por sua douta sentença exclui o Die Linke do espaço
governativo.
Omite a articulista que o Die
Linke que ela afasta, obtém 18,8% no Estado de Berlim sendo a 2ª força atrás da
CDU (tendo esta pouco mais de 20%); 17,2% em Brandenburgo (3.º lugar) e 17,8%
na Pomerania Ocidental (3.º lugar) e que participa nos governos dos estados de
Berlim; Brandenburgo e Turingia[2].
Omite que o Die Linke que ela nem
sequer refere, subiu de 8,2% e 64 deputados (em 2013), para 9,2% e 69 deputados (em 2017).
Uma simples sequência de omissões
das muitas omissões emitidas (com arte, diga-se).
Que nada mais são que expressão
de vontades próprias.
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