Nota de enquadramento: Quando se aproximam as eleições autárquicas e com elas temos a oportunidade de escolher as pessoas que queremos à frente dos governos das nossas cidades e quando, teimosamente acredito, que essa escolha por parte de cada um de nós é efetuada com base numa criteriosa análise aos programas com que essas pessoas se apresentam perante nós, eleitores, julgo importante publicar o artigo que se segue e que um amigo me fez chegar.
Trata-se de um contributo para analisar os graves problemas com que se defronta o CH de Évora, classificado pela UNESCO Património da Humanidade.
Assim o exemplo tenha sequência.
Porque senão a campanha eleitoral será uma enorme chalaça (ver, Diário do Sul , 22.08.2013 – arrazoado de um tal Chalaça – uma chalaça pegada).
Uma abordagem em torno da dinâmica populacional
1991 - 2011
Confesso que, nos momentos em que tudo parece ser analisado pela lógica dos números e de rácios construídos, cheguei a considerar contraproducente abordar a temática populacional.
De facto, eliminam-se feriados e atenta-se contra a memória histórica em nome de um rácio que se estabelece entre o PIB e cada um dos dias do ano, encerram-se maternidades e forçam-se partos à beira da estrada, por vezes em país alheio, por força de uma relação que se estabelece com base no número de parturientes por ano, encerram-se serviços públicos, carreiras de transportes públicos, estações de correio e postos das forças de segurança, sempre com base nos mesmos argumentos.
Por isso, repito, o meu constrangimento em abordar a dinâmica populacional do Centro Histórico de Évora nos últimos anos. É que, face aos números temi que se corre-se o risco de alguém propor como solução, que o mesmo seja fechado.
Imaginemos o letreiro, provavelmente redigido em Português, Francês e Inglês: «Por motivos de uma diminuição acentuada de população e consequente diminuição de receitas, vemos-nos forçados a fechar o Centro Histórico. Para qualquer assunto, toque a campainha s.f.f.»
Mas, como considero que, apesar desta perspectiva, o desconhecimento dos factos ou mais apropriadamente o alheamento sobre os mesmos,não é de certo estratégia e são mesmo razões, entre outras, para a ausência de medidas de correção da tendência e que, sem elas, o cenário irónico pode muito bem ser o cenário real dentro de pouco tempo, trago para reflexão, alguns números:
População do Centro Histórico de Évora (1991 - 2011)
Freguesia | 1991 | 2001 | 2011 | Saldo entre 1991 e 2011 |
St. Antão | 2068 | 1473 | 1303 | 765 |
S. Mamede | 2920 | 2170 | 1725 | 1195 |
Sé e S. Pedro (1) | 2894 | 2025 | 1691 | 1203 |
Total | 7842 | 5668 | 4719 | 3 163 (40,3%) |
Fonte: Para a generalidade dos dados : INE - Censos 91;01 e 11
(1) Esta freguesia foi criada em Julho de 2007 e resulta da junção da anterior freguesia de S. Pedro com a parte remanescente da Freguesia da Sé, situada dentro das «muralhas» (Centro Histórico). A freguesia da Sé foi extinta e deu lugar às Freguesias urbanas «fora das muralhas»: Bacelo, Horta das Figueiras, Srª da Saúde e Malagueira.
(2) Soma do n.º de habitantes da Freguesia de S. Pedro com o resultado da aplicação de um cálculo sobre o número de habitantes da parte remanescente da Freguesia da Sé (Fonte: Anexo PDM - CME).
A perda de 3163 habitantes em vinte anos, o que representa 40,3% face à população de 1991 demonstra friamente, uma preocupante realidade. O CH esvazia-se de gentes e consequentemente de funções.
Basta percorrermos as suas ruas, becos, ruelas e praças para constatarmos «in loco» os efeitos destes «números»: casas degradadas, comércios encerrados, solidão.
E só o facto de algumas funções ainda se manterem no CH (como por exemplos, a hospitalar, a cultural a financeira) a que se juntam as consequências da existência de uma Universidade (cujo campus é o próprio CH) vai contribuindo para «mascarar» o problema.
Mas os efeitos resultantes da ainda concentração dessas funções no CH são transitórios e tem pouca expressão na dinâmica populacional.
O CH de Évora funciona com horário de escritório das nove às sete e como destino mais tardio para noctívagos em busca dos bares.
O arrendamento temporário, no CH, de casas e quartos por parte dos estudantes deslocados, sofre os efeitos da diminuição do número de alunos (consequência da grave crise económica do país e de uma política de ensino cada vez mais restritiva aos que têm pouco) e por outro lado, também de uma oferta crescente «fora das muralhas» de maior qualidade.
Os bares e os hábitos associados ao seu uso, se por um lado trazem população flutuante à noite na cidade, são por outro, factor de perturbação com a população residente envelhecida e com hábitos de vida diferentes a queixar-se das constantes violações ao seu direito ao descanso.
Não estão devidamente identificadas as causas determinantes para este êxodo populacional (verifique-se que ocorre em sentido diverso à dinâmica geral da cidade e até mesmo do total concelhio) mas não é difícil supor como sendo prováveis: as de natureza administrativa e patrimonial; a área reduzida da maior parte das habitações; os custos de recuperação; as dificuldades de realização de obra; os acessos, as normas apertadas no uso de materiais e de construção; as problemáticas associadas ao carro (tornadas culturalmente centrais); a inexistência de profissionais habilitados à recuperação, a difusão e assunção de determinados «valores culturais», serão certamente, algumas delas.
A par da perda de efetivos populacionais, acrescem como problemas, os que derivam da estrutura etária nomeadamente os indicadores de um acentuado envelhecimento.
Estrutura demográfica da população do CH
| 1991 | T | 2001 | T | 2011 | T |
| 00-14 | 15-24 | 25-64 | >65 | 00-14 | 15-24 | 25-64 | >65 | 00-14 | 15-24 | 25-64 | >65 |
Sé S. Pedro | 373 | 317 | 1392 | 772 | 2854 | 164 | 210 | 922 | 729 | 2025 | 142 | 160 | 844 | 545 | 1691 |
% | 13,07 | 11,11 | 48,77 | 27,05 |
| 8,1 | 10,37 | 45,53 | 36 |
| 8,4 | 9,46 | 49,91 | 32,23 |
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S.Mamede | 420 | 360 | 1405 | 735 | 2920 | 205 | 241 | 990 | 734 | 2170 | 138 | 165 | 851 | 570 | 1724 |
% | 14,38 | 12,33 | 48,12 | 25,17 |
| 9,45 | 11,11 | 45,62 | 33,82 |
| 8 | 9,57 | 49,36 | 33,06 |
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Sto. Antão | 227 | 238 | 1039 | 564 | 2068 | 118 | 173 | 654 | 528 | 1473 | 124 | 107 | 672 | 420 | 1323 |
% | 10,98 | 11,51 | 50,24 | 27,27 |
| 8,01 | 11,74 | 44,4 | 35,85 |
| 9,37 | 8,09 | 50,79 | 31,75 |
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Total CH | 1020 | 915 | 3836 | 2071 | 7842 | 487 | 624 | 2566 | 1991 | 5668 | 404 | 432 | 2367 | 1535 | 4738 |
| 13,01 | 11,67 | 48,92 | 26,41 |
| 8,59 | 11,01 | 45,27 | 35,13 |
| 8,53 | 9,12 | 49,96 | 32,4 |
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No total do CH a população com mais de 65 anos passa de uma percentagem face ao total, de 26,41% em 1991 para 32,4% ao mesmo tempo que a população com menos de 15 anos passa de 13,01% para 8,53%.
Acrescente-se que este cenário ocorre num contexto, já descrito, de forte diminuição de efetivos.
Para uma outra abordagem, haveria a necessidade de analisar outros outros indicadores nomeadamente ao nível da mortalidade, dos saldos naturais e migratórios.
Esta estrutura etária dá origem aos índices seguintes:
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| Indice Juventude | ìndice Envelhecimento | Indice Dep Idosos |
| Sé e S. Pedro |
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| 1991 | 48 | 207 | 45 |
| 2001 | 22 | 445 | 64 |
| 2011 | 26 | 384 | 54 |
| S.Mamede |
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| 1991 | 57 | 175 | 42 |
| 2001 | 28 | 358 | 60 |
| 2011 | 24 | 413 | 56 |
| Sto. Antão |
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| 1991 | 40 | 248 | 44 |
| 2001 | 22 | 447 | 64 |
| 2011 | 30 | 339 | 54 |
| Total CH |
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| 1991 | 49 | 203 | 44 |
| 2001 | 24 | 409 | 62 |
| 2011 | 26 | 380 | 55 |
Assim, enquanto em 1991, a relação entre o n.º de jovens e o n.º de indivíduos com mais de 65 anos era de 49, em 2011 essa relação passa para 26. Ou seja, para cada 100 indivíduos com mais de 65 anos, existem 26 com menos de 15.
O índice de envelhecimento passa de 203 para 380 e o índice de dependência de idosos (relação entre o número de indivíduos com mais de 65 anos e os que situam entre os 15 e os 64) de 44 para 55.
Procedendo à comparação com os contextos: concelhio, regional (Alentejo sem a NUTS Lezíria do Tejo) e nacional (continente) (dados 2011):
| Índice Envelhecimento | Índice dependência idosos |
Centro Histórico de Évora | 380 | 55 |
Évora (total concelhio) | 138 | 30 |
Alentejo (sem Lezíria do Tejo) | 194 | 41 |
Portugal (continente) | 131 | 29 |
O quadro mostra à evidência que, os valores registados no CH para os dois índices são extraordinariamente superiores, seja qual for o contexto base para comparação.
A conclusão possível para o demonstrado, quer nesta questão do envelhecimento, quer na diminuição dos efetivos populacionais só pode ser: temos aqui um problema, grave.
Vejamos em seguida sobre a perspectiva comparativa do efetivo populacional do Centro Histórico com a população da cidade.
Relação do peso populacional do CH com a cidade
| 1991 | 2001 | 2011 |
Cidade (1) | 38952 | 41164 | 42092 |
C. H. (2) | 7842 | 5668 | 4719 |
Peso Relativo CH/Cidade | 20,13 | 13,77 | 11,21 |
1.Operacionalizado através de um rácio estabelecido entre o somatório das Freguesias “da cidade” e a população que corresponde ao interior do seu perímetro urbano - cidade de facto. Tal atitude já é tomada quando dos trabalhos de caracterização que constam dos anexos à revisão do PDM, no entanto, segui critério ligeiramente diferente (que produz resultados com diferenças praticamente inexpressivas) e, considerando que o (INE - Atlas das Cidades - 2004) com base em dados dos Censos de 2011, identifica para a cidade 41164 habitantes, não só trabalhei com esse dado para 2001, como estabeleci a relação com a população das freguesias já referidas e apliquei rácio obtido (91,87) a 1991 e 2011.
O quadro reforça o que já se havia demonstrado: o esvaziamento populacional do Centro Histórico, teve neste últimos 20 anos expressão muito expressiva.
Para a análise desse processo e sem se pretender de forma alguma minimizar os factos, não podem deixar de ser considerados os factores seguintes:
Ao invés do que ocorre na zona «extra muralhas», no CH são naturalmente escassas as possibilidades de oferta de terreno para construção nova.(Anotemos por exemplo, como exceções: Edifício de St. Catarina; Convento de S. Domingos – onde se verificou um misto de reconstrução e de construção nova) e Cerca de Stª Mónica;
Por outro lado,
Não seria certamente de bom censo, esperar que a população do CH tivesse hoje níveis semelhantes aos verificados nas décadas de 60 ou 70. Os níveis de qualidade de vida e as exigências atuais são incompatíveis com a densidade populacional que então se verificava.
Ressalvadas que sejam estas duas premissas, convém não as levar em excessiva linha de consideração ou seja, partir da sua constatação para justificar o que não justificam para o todo (só para uma parte) do problema.
Não cabia no objectivo desta abordagem apresentar propostas ou sugerir medidas.
Pretendeu-se minimamente contribuir par o diagnóstico do problema e como se afirmou o mesmo é muito grave.
O Centro Histórico de Évora está em grave declínio e deve ser encarada com urgência terapia que estanque o problema e que tenha as pessoas no centro das suas atenções.
Por mais bonito e grandioso que seja o enquadramento paisagístico da acrópole e por mais pujante que possa estar o Templo, convém não deixar de ter presente que as cidades são a sua condição e as pessoas que as habitam.
Um Centro Histórico sem gentes a habitar as suas casas e fazer das suas ruas as suas convivências, é um espaço sem «património».
No essencial, por força da localização do Teatro e da generalidade das sedes de associações.
E já com muitas e significativas exceções.
Embora ligeiro, há crescimento populacional no total concelhio, diminuição no espaço rural (e no CH como estamos a constatar) e crescimento na zona de transição (Canaviais).