domingo, 24 de janeiro de 2010

Certamente por lapso



Insisto nas questões do património (entendido este na perspectiva que aqui já deixei ficar clara) porque o considero um tema da máxima importância.
E é por assim ser que acompanho com atenção todas as iniciativas que o tenham como objecto de análise e discussão, assim como a própria acção dos auto designados patrimonialistas.
E são patrimonialistas os arquitectos; urbanistas, paisagistas, historiadores, arqueólogos, artistas, historiadores da arte e quase nunca aqueles que a ele se dedicam na perspectiva social.
Como se o património fosse algo que deve ser estudado de forma dissociada da sua componente vivencial, como se tivesse surgido do nada, nada representasse no presente e para o nada caminhasse.
Para além daquele universo de frases feitas, tipo «as pessoas também são património» é um facto que hoje ninguém questiona a importância do património imaterial no conjunto dos bens patrimoniais, assim como, são muitos os que entendem que, por exemplo só com a vivificação dos centros históricos
se garante com eficácia a sua preservação.
Que perturbante seria calcorrear as ruas e travessas de um centro histórico sem gente. Como já é perturbante verificar o estado de ruína de muitos dos seus edifícios, constatar que o barbeiro fechou, que a mercearia tem afixado um grande cartaz de vende-se de uma conhecida imobiliária, que a taberna virou snack e que este virou coisa nenhuma.
Só há uma verdadeira política patrimonial se esta tiver no seu cerne e como objecto as pessoas. Pessoas que o salvaguardem, que o projectem, que o usufruam e que o entreguem em bom estado de conservação às gerações futuras.
Não nos esqueçamos que o património é um elo geracional.
O texto de hoje, sendo a este propósito, é também um estado de alma.
Aqui, nesta cidade que em tempos se soube projectar ao estatuto de Património da Humanidade, habituámo-nos a ver o desprezo a que se vota a «galinha dos ovos de ouro», a desprezar-se e a questionar-se a utilidade de investir na salvaguarda do centro histórico.
Aqui o património não se enquadra com a «excelência». E a «excelência»como sabemos é acabar com o cinema, com as iniciativas que preenchiam as ruas, é construir praças de touros em praças alheias e chamar-lhes arenas, é promover o marialvismo e dar a primazia à comedora de croquetes.
Mas não gosto e esse até é o propósito central do texto que, onde esperava que nas questões patrimoniais pusessem em primeiro plano as pessoas, constate que se promovem umas jornadas do património (Montemor-o-Novo) onde estas não estão incluídas.
Vão discutir o património e discutem desde o megalitismo à azulejaria, das espécies autóctones dos Sítios de Cabrela e Monfurado ao Rio Almonsor e não discutem o riquíssimo património imaterial do concelho, as problemáticas associadas ao habitar nos centros históricos, a forma de usufruto patrimonial ou as formas de potenciar o património como factor para o desenvolvimento económico e social.
Acredito que em Montemor é só um lapso.

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