sexta-feira, 28 de setembro de 2012

EXPOSIÇÂO


Sete fotografias de Portugal

Legendas quase breves para breves retratos a preto e branco . Mais preto que branco…

À entrada deve ser colocado o aviso: Esta Exposição contém cenas susceptíveis de impressionar os visitantes. (principalmente os que têm andado distraídos).

Foto: 1
Enquadramento: Hienas com dentes ensanguentados
Moldura: Paus de carvão
Legenda: Gulosos pululam, salivando, ao cheiro de dinheiro fresco. Antes, ainda cuidavam de alguma reserva, mas agora fazem jus à sua gula, não só  descaradamente mas com um atrevimento insolente.
É preciso privatizar a CGD.
A bem de Portugal, claro.

Foto: 2
Enquadramento: Sereias em cândidas cantorias:
Moldura: Entrelaçado de hipocrisia sobre arco pintado de azul celeste
Legenda: Nem todos podem ter acesso a tudo, disseram em nome de uma ética.
E quem foi dotado desse poder supremo de poder decidir?
Ninguém vai acreditar (pois não?) que os senhores éticos estavam simplesmente a dizer que quem tem dinheiro, tem direito aos tratamentos, quem não tem…que vá morrer longe.
É preciso racionar (ou racionalizar) recursos.
A bem de Portugal, claro.

Foto: 3
Enquadramento: Carantonhas espreitando a medo, a uma das janelas do palácio em ruínas
Moldura: Aro de fogo
Legenda: Ufa. Já passou diz um dos espreitadores. Achas? pergunta a medo, muito a medo, a que estava logo atrás.
E se eles voltam?
Tranquemos-nos por aqui, fechamos janelas por causa do barulho e vamos dando améns..
A bem de Portugal, claro.

Foto: 4
Enquadramento: Cenas mais «expressivas» extraídas de “La grande bouffe “
Moldura: Intestino de boi
Legenda: Em sequência patética vão desfilando os comentadores, inchados, gordos, olhos arregalados, doutores, professores, engenheiros e outros eiros, falando de dívida, honra, esforçando-se por apresentar como inevitável o que era evitável.
Apelam à honra dos honrados que não têm culpa e dão toques de cor de rosa aos culpados sem honra.
São os arautos do sistema cada vez mais parecidos com os bobos do sistema.
A bem de Portugal, claro.

Foto: 5
Enquadramento: Anjinho de asas, escondido atrás de uma nuvem
Moldura: Aro de espinhos sobre algodão
Legenda: Ansioso, aguarda a oportunidade. Já fez de tudo e tantas vezes contrariado. Passeou-se em feiras, armou-se em homem de lavoura, afundou-nos com submarinos. Casou-se à pressa e por mero interesse (e só depois de consumar o casamento é que informou) e agora espera pelo momento certo para cobrar rica pensão de alimentos.
A bem de Portugal, claro

Foto: 6
Enquadramento: Cenas do fogo de Alexandria
Moldura: Lombadas de livros calcinados
Legenda: Teve entrada de leão, rugindo ameaçadoramente e ainda hoje, mesmo acossado, continua a manter um rugido, mais esporádico é claro, mas mesmo assim, assustador. Uns sacanas abelhudos descobriram-lhe a receita rápida para o canudo o que o tem deixado um pouco atarantado.
Tem procurado aplicar, com o mesmo zelo, uma receita rápida para destruir tudo o que lhe cheire a Abril, seja nas autarquias, seja nos direitos dos trabalhadores.
Convenientemente, ultimamente,  mandaram-no rugir para longe daqui.
A bem de Portugal, claro

Foto: 7
Enquadramento: Imagem a três dimensões de Portugal a afundar-se no Atlântico  vendo-se uma figura terrivelmente parecida com o primeiro ministro a fazer força, calcando.
Moldura: Contornos graníticos do mapa de Portugal com o vértice inferior esquerdo espetado sobre os Lusíadas e o direito sobre o pescoço de Camões.
Legenda : Quando tudo ameaça ruir (qual orquestra do Titanic) PSC (um dia esclarecerei a sigla) mas parte dela significa Passos Coelho, cita Camões (Ah Camões, pobre Camões, quão semelhante está teu fado ao nosso), permite (incita) que o seu chefe de segurança  amedronte um jovem e empurre um operador de câmara e anuncia mais uma medida daquelas que prometeu nunca tomaria.
Não se preocupem, ele pedirá desculpa…
A bem de Portugal, claro.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

E depois do adeus?

 

Os escribas encartados e os analistas de alcofa andam extremamente atarefados - procuram a todo o custo espalhar a ideia de que a tempestade passou.
De facto, este Outono teve pressa em se anunciar e forçou-nos a recebe-lo com umas valentes caqueiradas de água, mas não são estas tempestades  que os preocupam, ou melhor, que os preocupam a eles e aos respectivos patrões.
As tempestades inquietantes (para eles)  são os mares de gente que encheram as ruas e praças das nossas cidades, são os protestos diários onde um qualquer deles ponha os pés, são a determinação e convicção demonstradas . É a lucidez expressa nos comentários e no construir de slogans.
Eles querem convencer-se (nos) que já passou.
Que bastam uns pequenos retoques de cosmética e uma retórica retirada das ajudas sentimentais (entre os parceiros da coligação está tudo bem, afiançam, afinal continuam a viver sob o mesmo tecto…) para que tudo volte à normalidade.
E a dar-lhes razão corre sôfrego o PS - assim.. (como?) - já não apresentam moção de censura e mais aquele eterno e entediante servidor que teima em falar como dirigente sindical e que é e sempre foi um refinado traidor dos trabalhadores
Por pouco tempo estiveram (estiveram mesmo?) do lado certo da barricada.
Pois agora e neste contexto o que se vai seguir?
Do lado de cá da barricada, como se vão desenrolar as coisas, como vão agir os diversos atores?
Espero que nas ruas nos continuemos a encontrar com os homens e mulheres honestamente socialistas.
Espero que outros abandonem a postura  de se  «pôr  em bicos de pés» que têm assumido por estes dias. Que todos se convençam que ninguém é dono de ninguém e que para terem estado os que estiveram, muitos dos que lá estiveram, já tinham estado em  muitas outras.
A luta não nasceu agora.
Agora só ganhou uma dimensão como ainda não tinha tido até aqui.
Por isso, meus senhores, não vos embriagueis.
De alguns ouvi, o que só a embriaguez pode provocar: que estes protestos foram protestos contra os políticos - Ai como os políticos responsáveis pelo estado das coisas gostam de ouvir isto…
E outros, no mesmo sentido de pensamento, afirmar que é preciso tirar os partidos das lutas.
Tão de esquerda, tão de esquerda que eles são…só que usam argumentos fascistas.
Nos protestos devem participar os partidos - que sempre protestaram - os partidos que entendam (mais vale tarde que nunca) protestar, os militantes destes partidos e dos outros (porque se sentem traídos), os homens e mulheres sem partido. O povo.
E este não merece, que agora estraguemos tudo.
Nestes últimos dias dissemos adeus não só a um governo , mas acima de tudo a uma política podre e velha de mais de trinta anos.
Mas quando é que uns e outros se vão mesmo embora?
Ah, a propósito, eu no sábado dia 29, vou estar de novo na rua.
Pelos mesmos objectivos!

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

MUDAR DE RUMO

A propósito das manifestações de 15 de setembro, todos o sabemos,  ainda vão correr muitos bit(s). O sentido de uso de muitos desses bit(s) começou a insinuar-se no próprio dia dos acontecimentos.
Retenho-me, para já, em considerações sobre «uma» leitura.
Assisti, curioso, ao esforço de um jornalista, que em perfeita descoordenação com o que havia ouvido dos entrevistados por si, insistia em concluir que aquela manifestação era a «condenação clara dos políticos, de todos os políticos».
Estou perfeitamente convencido que por aqui, muitos vão seguir. É caminho conveniente, acima de tudo, extremamente conveniente para os responsáveis da situação. 
É certo que no calor das coisas podem ocorrer lapsos  e que os jornalistas também os podem cometer. Retenho  a informação enfática de uma jornalista que a propósito da manifestação de Lisboa afirmava que se falava na presença de  500 mil pessoas e ela alvitrava que haviam mesmo fontes que falavam em meio milhão.
Numa outra passagem, e durante um debate, alguém utilizou o conceito de anomia e em nota de rodapé o mesmo foi transposto para anemia.
Mas não creio que a «condenação dos políticos» de que já falei se integre no grupo dos lapsos e reafirmo que considero que se trata de clara estratégia.
Mas julgo que o que importa agora e o que provavelmente importará a todos os que participaram no protesto é procurar saber o que se vai seguir.
Portas, oportunista como sempre, joga no sentido de fazer passar em exclusivo para o seu parceiro de Governo o ónus da questão.
O PSD, evidentemente, não vai querer ficar com as culpas.
Vai daqui resultar um divórcio amigável? Um Governo PSD com o beneplácito parlamentar do CDS.
Quanto tempo duraria?
Outro cenário, com enquadramento teórico na estratégia de «condenação dos políticos» e já  insinuado por alguns «conselheiros» passaria por constituir um Governo de tecnocratas a que eles chamam pomposamente de «Salvação Nacional».
Uma outra possibilidade - Passos já a admitiu - são pequenas operações de cosmética  para retirar a carga inflamatória da proposta sobre a TSU e salvar assim, no essencial, os propósitos de destruição de direitos, em curso.
Mudar de rumo, que foi o sentido claro dos protestos de sábado, isso tentam evitar a todo o custo.
Dar a voz ao povo - mesmo sabendo que o povo, no voto, é frequentemente dado a dar-lhes o que querem - é ideia que os assusta.

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

O QUE QUER O DITO CUJO?

 

Nestes turbilhados dias  em que nada parece já ser suficiente para me causar admiração, procuro no rasto das coisas, um fio de entendimento, algo que me ajude a perceber o que está a acontecer.
O óbvio, todos sabemos, ou seja, estamos perante uma revanche recalcada e uma tentativa bruta de uma última estocada nos direitos democráticos e sociais que ainda restavam.
Sabemos e sentimos.
O que não sei e procuro descortinar é o porquê desta aparente insana teimosia do homem em esticar a corda?
Os correligionários, com medo dos destroços, avisam-no.
Os ratos, oportunistas como sempre, anunciam ir saltar.
Os que têm tanta culpa como eles, com pouco mais de ano e meio de jejum, já sentem  um apetite impetuoso e uma oportunidade de o saciarem (antes mesmo do que esperavam).
Mas mesmo assim, o dito cujo insiste e com aquela cara de …ameaça com mais.
Cheira-me a esturro. Deve esperar borrasca, para procurar demonstrar que sem ele, nos espera o caos.
O homem provoca, para que a gente reaja.
Espera ver montras partidas, carros incendiados e outras cenas semelhantes para, nesse contexto, pôr o seu boné de policia e salvar o país.
Não descuro mesmo que tenha ensaiado algumas cenas reais.
Quem já alguma vez leu o 18 de Brumário (K. Marx) conhece a estratégia.
A ser este o cenário (que parece desejar e fomentar) teria oportunidade para:
Dar grandes enxertos de porrada nos que contestam nas ruas a sua política criminosa;
Desfazer-se de empecilhos;
Calar correligionários;
Descansar sua excelência.
Manietar os tribunais.
Ou seja, uma suspensão da democracia, não temporária, como dizia a velha…senhora, mas permanente.
Por mim quero acreditar, que depois de uma borrada o povo não volta a fazer outra - pelo menos num espaço de tempo tão curto .
Se numa primeira borrada lhe deram o voto que não se caia numa segunda borrada de se lhe dar o pretexto.
Por muita vontade que às vezes (legitimamente) nos percorre por dentro…

Vamos pois encher as praças e ruas deste país com a força dos nossos protestos e sem dar razão a quem quer construir pretextos.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

UMA QUESTÃO DE LEGITIMIDADE

 

Já por aqui rebusquei, em tempos, qualquer coisa em torno dos conceitos de legal e de legitimidade.
Dando de desbarato as questões de ordem legal, porque estas são sempre a expressão dos dominantes, volto agora, em exclusivo, às questões da legitimidade.

Por exemplo, será legítimo e até mesmo expectável,  que quando um homem diz uma coisa hoje e o seu contrário logo de seguida,  logo seja chamado de mentiroso.
Será no entanto legítimo que, quando esse homem ocupa cargos públicos e os ocupa  porque prometeu a quem o escolheu, determinadas coisas e depois faz precisamente o contrário, chamar-lhe exatamente o mesmo, ou seja, mentiroso?

Há aqui, claramente, um questão de legitimidade em aberto.

Para o mentiroso (este, o fino) legítimo é mentir.
Chamarem-lhe mentiroso, é obviamente, ilegítimo.

 

Num outro exemplo, hipotético claro, será legítimo  dar um pontapé num carro desse homem ou até mesmo uma bofetada  no dito cujo, por força das mentiras que prega e dos danos que causa?
Não, obviamente que não, gritarão em uníssono os legitimistas. Tal comportamento é mesmo um crime, dirão.
Mas não é crime que esse homem tome medidas que tiram o pão da boca dos filhos do homem que pontapeou o carro ?
Criminosa será, para os legitimistas,  a atitude do homem  desesperado (que pontapeia) e não as do canalha (mentiroso e desumano) .

Há aqui claramente uma questão de legitimidade em aberto.

E perante elas, opto pela legitimidade que advém do carácter, de quem se move erguido.