quarta-feira, 16 de maio de 2018

Smart Cities


Smart  Cities

Podem-se acrescentar outras definições.
Em inglês, como convém para dar um ar, digamos…erudito.
Podemos falar de cidades sustentáveis. Verdes. Ecológicas. Inclusivas.
Mas permita-se um comentário menos in.
As cidades, que deveriam ser gente, têm sido construção e automóveis.
Falamos muito de mobilidades suaves e descarbonizadas e desprezamos a mais suave e descarbonizada delas, andar a pé.
Permitam-me uma pequena novela:
Faço o percurso entre casa e o emprego a pé.
Num terço do trajeto o passeio tem a largura do lancil e espaço para um dos pés.
No outro terço, o passeio já é mais largo e por isso está pejado de automóveis que forçam a minha mobilidade pela via que lhes é reservada.
O piso dos passeios, onde há passeios com piso, é irregular e de pedras bicudas.
No piso (macio e liso) para os automóveis, onde tenho que seguir no terço do trajeto como disse, quando chove faz-se um lençol de água que em chuvadas mais intensas chega a ter a altura do lancil.
Escusado é dizer o estado em que fico.
Escaldado…queria escrever molhado, opto por me proteger colocando entre mim e as ondas de água projetada, o guarda-chuva, levando com a que cai do céu.
No trajeto, acabado o primeiro terço – o melhorzinho dos três em que dividi esta novela – atravesso uma bifurcação (?) e tenho de me munir de todos os cuidados. A visibilidade é nula e as velocidades altíssimas. Há um sinal limitador de velocidade – 30 kms mas creio que se esqueceram do 1 à esquerda do 3.
Atravesso mais duas vias que entroncam na via principal onde sigo. Numa, não tenho problemas, mas na outra que é um acesso a uma escola de gente com dinheiro para pôr lá os meninos e as meninas e para comprar grandes bólides, é correr para não ser passado a ferro.
E resmungam-me. Já dei por mim a pensar se um dia tenho uma cãibra a meio…ui…
Depois desta destemida e aventurosa travessia, tenho pela frente um passeio largo, qual oásis, que circunda um grande e moderno edifício sede de serviços públicos onde funcionam os serviços de planeamento e ordenamento do território.
Este largo passeio, já protegido em escassos metros por pilaretes metálicos, é, para mal dos meus pecados e dos meus companheiros de infortúnio, zona de estacionamento em massa e de atravessamento para estacionamento improvisado nas traseiras do edifício, para funcionários e utentes (e os utentes, por vezes, têm fardas e carros com pirilampos e dísticos de psp e gnr)
Garanto que se houvesse ao longo do percurso um banquinho para descansar, chegado aqui ou passado daqui, me sentaria a descansar um pouco. Se houvesse uma sombra…se houvesse um bebedouro…
Finalmente, estou na cidade velha. Aqui não se pode construir de forma moderna nem abrir vias modernas (para automóveis), cirando por entre pessoas por debaixo dos arcos. Até pode chover…o sol até pode estar impiedoso…
Aqui é a cidade velha.
Não havia, no tempo velho em que a construíram, smart cities.
A propósito, ou não, expresso aqui a esperança, que um dia, os que pensam as cidades, pensem que elas também são para as pessoas.
Parece-me.
E que andar a pé pode não ser piroso e de pobrezinho.

Horas e oras


Horas e oras…

Sabemos que os rios correm para o mar (mesmo que por vezes se juntem a outros rios ou descansem num qualquer lago) e por o sabermos, não duvido que aquele que agora contemplo esteja a seguir esse destino, mas não parece.

Tão calmo. Tão sereno.

São quase impercetíveis os murmúrios das suas águas.
Talvez porque o mar já esteja perto e ele não tenha pressa.
Talvez porque todo o seu trajeto foi feito devagar, calmamente na planície.
Talvez…porque é assim. É a natureza.
Quem criou o mundo teve falhas grandes e uma delas foi a criação do homem mas era um arquiteto paisagista de primeira ordem.
Ali, naquele sitio tão perto e aonde nunca tinha ido, tenho claramente essa perceção.
Oiço com perfeita nitidez as seis badaladas do relógio da Igreja.
Pouco depois, segundos talvez, oiço com menos nitidez, vindas do outro lado do rio, da igreja que se destaca no triangular casario branco, sete badaladas.
São sete horas em Salúncar e são seis em Alcoutim. Uma hora de diferença inventada pelos homens.
Umas breves remadas e os de cá chegam lá e os de lá vêm cá.

A obra da natureza está ali, imponente e bela.
A obra dos homens, troca-lhes as horas.

terça-feira, 1 de maio de 2018

Uma gata no banho