terça-feira, 30 de setembro de 2014

Memorias

Memórias

Em tempos, vi algures e li, um escrito cujo objetivo principal consistia na recusa do passado e na defesa de um presente que tinha necessariamente de estar dele desassociado.
Esse escrito foi feito por um de nós, por um que pe
nsa no futuro como nós.
Critiquei e mantenho hoje a crítica a tal entendimento «teórico» por mais bem fundamentada que seja a argumentação em sua defesa.
Nesta crítica não preciso de fazer nenhuma «declaração de princípios» sobre posicionamentos face ao passado, mas lembro a propósito que, para os que grosseiramente queiram ver nesta posição algum traço de branqueamento de um passado que em conjunto renegamos, que algures, também no passado, vivemos e construímos tempos maravilhosos alicerçando os pilares da sociedade mais justa pela qual lutamos.
São as memórias destes tempos últimos que transporto no caminho que em conjunto percorremos rumo ao futuro
Algures, nesse passado que nos constitui e que transportamos nas jornadas de hoje, estão as memórias de alguns que já não podem estar aqui, ao nosso lado.
E é até uma nossa canção hino que nos remete para este plano.
E se alguns não podem, porque as leis da vida e da natureza assim o determinaram- recordo e incluo na homenagem o Gama e o Pedro - outros não podem porque lhes ceifaram a vida no decorrer da luta.
E é de Caravela e Casquinha que me lembro.
No sábado, trinta e cinco anos depois, lá estivemos na justa homenagem.
Estava um dia quente, há trinta e cinco anos.
Tão quente como a luta que então travávamos na defesa da Reforma Agrária.
Agora, estava um dia sombrio, carregado de nuvens. Trovejava.
Há trinta e cinco anos, ao funeral de Caravela e Casquinha veio um mar de gente.
No sábado, à sua homenagem. Vieram menos. Muito menos.
Coisas dos tempos.
Mas destes tempos fica também a marca dos que nunca esquecem.
Dos que resistem.
E que caminham em frente com a memória e o exemplo deles presente.
A memória pode pois ser tónico e só assim fará sentido

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

O Vespeiro

vespas…vespas…vespas….

Graças à wikipédia fiquei a conhecer um pouco mais sobre vespas.

Partilho o essencial da informação que recolhi e passo a citar a fonte a que aludi: são insetos pertencentes à ordem dos himenópteros sendo responsáveis pela polinização de diversas espécies de plantas.

Depois de saber da utilidade, sinto-me preparado para suportar com maior sentido cívico e estoicidade, a dor provocada pelas suas picadas.

Fiquem a saber meus amigos que quando dizemos que nos picou uma vespa, foi mesmo uma vespa, pois os machos das vespas não têm ferrão.

Dolorosas picadas femininas.

A «casa das vespas» é muito parecida com a das abelhas e por estranho que pareça estas criaturas também produzem mel. Forte e amargo, para seu descanso e garantia.

O vespeiro é, a casa das vespas.

Em sentido figurado, pode ser, muita outra coisa.

Como sabemos, vespas, também são motocicletas.

Cidades italianas e de outras paragens, em que está na moda andar de «vespa», poderão assim também ser denominadas de vespeiros, tantos são os seus habitantes a cirandar de vespa as suas ruas e avenidas.

Dando largas à imaginação, também podemos chamar vespeiro, a uma determinada casa, ou instituição, por onde cirandem, vespas ou pessoas que queiramos denominar de vespas – por semelhança de comportamentos.

Pois, do que quero falar é de um vespeiro - casa - instituição.

Há tempos, por razões que agora não importam, a rainha – sim, as vespas também têm rainhas – foi substituída por outra rainha.

E ao reboliço habitual de um vespeiro juntou-se ainda mais reboliço. Umas vespas e também vespos (perdoem mas decerto concordam que facilita – caramba, estar sempre a escrever vespa macho…) já habituadinhas e habituadinhos aos seus favinhos, senhores de rotinas e mandadores das vespas e vespos mais reles, depressa se bandearam para a nova rainha. Salamaqueque para cá, salamaqueque para lá – uma salamaquice pegada.

Outras vespas e vespos, arredados dos favos desde os tempos da outra rainha ainda – uma rainha anterior à rainha que agora foi substituída – deram corda às asas e presentearam a rainha com ruidosos raides e bonitas coreografias.

E a maioria das vespas e dos vespos- que sempre estiveram laborando nos favos fosse qual fosse a rainha – aguardaram com alguma expectativa que a vida nos favos melhorasse.

Aguardaram…

Aguardaram…

Viram as danças, viram as coreografias e viram que nos favos nada mudou. Uma ou outra vespa ou vespo teve que baixar as asas, mas a maioria das vespas e dos vespos que controlavam a vida nos favos, continuou administrando-os como sempre fizeram.

As vespas e vespos que estavam agora no domínio dos favos – na sua grande maioria – ao invés de baixar a asa, voltaram a dar-lhe corda e a elas juntaram-se as outras vespas e vespos que estavam de asa caída desde o tempo da rainha anterior à que foi agora substituída.

E aos favos voltou a descrença. As vespas e vespos que acreditaram que a as coisas iriam melhorar, confrontam-se hoje com a triste constatação que nada melhorou.

E nos favos, onde havia pouco mel, hoje há ainda muito menos.

E assim todas as vespas e vespos irão definhar…

A nova rainha, parece atónita e nada faz.

É muito preocupante a vida neste vespeiro.

As picadelas destas vespas, parecem produzir o contrário das picadelas das outras, ao invés de polinizarem, secam tudo em sua volta.

E neste tipo de vespas, até os vespos picam também, e de que maneira.

Nota do «espojinho»: Este texto, foi enviado pelo «Porta Nova». Publico-o – sem o perceber – pela amizade que nos une mas não deixo de estar preocupado. Será que ele está bem? – Há tanto tempo que não dizia nada e agora isto!

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Ai há, há!

 

Diz a senhora, dando seguimento a outras parvoíces de igual quilate, que há em Portugal, profissionais da pobreza.

Não sei por que carga de águas aqui estou escrevinhando sobre coisa destas. Nas paredes das casas de banho públicas e em alguns comentários em blogues encontro dislates semelhantes e daí não deriva a necessidade de sobre eles, dizer alguma coisa.

Esclareço então que não é a parvoíce assim expressa que me faz tomar posição mas sim o imperativo moral de, mesmo que desta forma muito modesta, procurar dar voz a quem negam até o sussurro.

E assim trago para aqui a voz da jovem cigana de bebé ao colo que batendo à porta nos pediu qualquer coisa onde pudesse aquecer o leite para o bebé pois estava a fazê-lo numa velha lata de salsichas.

O bebé (ano, ano e meio de idade) tinha uma cicatriz resultante da abertura do seu peito por força de uma cirurgia ao coração…

Trago também a do homem que se habituou a visitar-nos e a quem damos semanalmente umas moedas. Educado, triste e disponível para aceitar comida: “não precisa de ser dinheiro” disse-nos.

Um dia, tivemos mesmo que descer, pois ele sentiu-se mal e não teve forças para enfrentar as escadas. Talvez seja da fraqueza, disse.

Não sou muito dado a caridades, mas há situações em que não nos é possível o alheamento.

Não faço questão de referir outros episódios. Todos nós os temos para contar. Infelizmente.

O que faço questão de afirmar é que, nas mediáticas campanhas promovidas pela associação desta senhora eu não darei mais, nem um bago de arroz.

Com todo o respeito que me merecem os que precisam desesperadamente de alguns bagos de arroz.

Não precisei no passado de agir responsavelmente para com eles, não será agora, que irei deixar de cumprir com os imperativos da minha consciência.

Eu sei, todos sabemos, que não podemos olhar o fenómeno da pobreza sob uma perspectiva romântica.

Há muito sacana a servir-se dos pobres para proveito próprio, assim como muito sacana a produzir pobres por força da sua ganância.

Todos sabemos também, de há muito.

Sempre os refastelados da vida, ajoelhando e rezando, despejaram nos alforges dos pobres as migalhas das suas sobras – às vezes já bolorentas – tendo sempre oportunidade de despejar também, os seus doutos e cristãos “aconselhamentos”.

«Ai, deixe-se desta vida…,coitados dos meninos».

«Trabalho para o seu marido?! – Ai não, o senhor beltrano diz que o ano foi muito mau…»

É velha e mal cheirosa esta escola.

Há profissionais da pobreza em Portugal?

Há, pois há!

Bebem champanhe e acompanham com caviar, vestem fino e pintam-se. Aparecem na TV e fazem discursos de merda.

terça-feira, 9 de setembro de 2014

Iguais calibres

 

É comum ouvirmos de alguns (não poucos), comentários através dos quais se faz passar a ideia de uma associação ideológica dos funcionários das autarquias às ideologias dos partidos que gerem – através do voto – essas mesmas autarquias.

Assim, se o Presidente de Câmara é PS, logo o funcionário dessa mesma Câmara é PS.

Usei PS, mas poderia ter usado um outro exemplo qualquer.

Convém ter presente que alguns – funcionários – dão importantes contributos para que essa ideia se difunda, mas não é essa a razão para o escrito.

Pretendo, isso sim, falar de profissão e política.

O que quero realçar é o direito à profissão sem perturbação política, sem que ao defender esta ideia esteja a defender pretensas e inexistentes independências.

A política é a forma (para uns, ciência, para outros, arte e para outros, manha) que os homens e as mulheres dispõem para gerir o espaço público, entendido este na pluralidade das relações e implicações que se estabelecem.

Renego a não política e ainda mais os pretensos e «superiores» não políticos. Estes, arvorados em «puros» nada mais são que os peões em uso pelos senhores de sempre.

E partindo do reafirmar destes princípios considero que, no exercício das nossas atividades profissionais, sejam elas exercidas em que contextos forem, mas no caso, quando exercidas numa determinada Câmara Municipal, não sendo «apolíticos» não podemos é ser tratados como agentes políticos do partido (ou dos «não partidos» com que alguns caciques agora se fazem eleger) do Presidente de Câmara.

Somos profissionais e devemos ser tratados como tal.

A não ser assim, cada um dos profissionais que exerce a sua atividade numa determinada Câmara Municipal, estava sujeito a ter que proceder a «resets» ideológicos por força de eventuais alterações políticas determinadas pelos eleitores dos seus concelhos.

É fácil pensar assim. Não é tão fácil agir assim.

A natureza humana usa estratégias para atingir determinados fins que não abonam muito a condição humana.

Esta é uma contradição recorrente e transversal e é um tema que gosto, mas agora abordo-o só de passagem.

E desta contradição resultam episódios de descarados atos de «vira casaca», a par de exercícios indolentes (que de facto estão na natureza de quem os pratica) em nome de uma pretensa ação política.

Vira casacas são vira casacas e valem o que valem.

Preguiçosos e negligentes, são sempre preguiçosos e negligentes.

Sendo isto certo,o que custa constatar é que não são poucas as vezes que vemos serem estes os compensados.

E quando assim é, também é fácil concluir sobre o carácter de quem está no poder e compensa estas atitudes.

São de igual calibre.

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Burrices

O título pode ser de molde a que desde já se fique à espera de mais um sermaozinho daqueles com que o espojinho nos brinda. Não e não senhor.Mas antes de entrar no que é, quero saudar a decisão de o espojinho ter decidido retirar a publicidade. Publicite as minhas sugestões e verá que são bem mais saborosas.
Pois o título tem como objetivo falar de burras, o nome que por aqui damos às queichadas dos porcos.
Estas podem apresentar-se-nos desde a forma mais rústica, ou seja, exatamente como se retiram do animal - com os dentes e tudo - com osso mas sem os dentes, desossadas e até mesmo fatiadas.
O preço varia e muito por força dessa apresentação e varia ainda muito mais por força da tipologia do animal. Mais baratas se de porco branco. Mais caras, se de porco preto. Nada a que não estejamos já habituados.
As que vos quero falar eram de porco branco - naturalmente - e com osso -mas sem dentes . Temperei na véspera com pimentão da carne - o tempero habitual de muitos enchidos- com algum sal - pouco , pois o pimentão já o tem -  reguei com um fio de azeite, salpiquei com folhas de louro grosseiramente partidas, moi sobre elas alguma pimenta preta, acrescentei um golo de vinho branco - nas burras, mas aproveitei a ocasião - e assim marinaram toda noite as ditas burras.
No dia seguinte foram ao forno a 200 graus .Hora e meia a duas horas depois estarão assadas, saborosas, suculentas.
Emprate com alguma classe. Fatie -agora- e acompanhe com batata frita aos cubos e uma boa salada de agriao.
Faça um favor - não coza o agriao ao juntar a salada ao prato - a salada tem direito a um prato.
Um tinto e boa companhia.
Estas são burras que gostamos de ter por companhia.
O da sopa dos pobres

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Gesto revolucionário

 

Ena tantos…

Sempre nos inebriámos com as multidões. Esperávamos ansiosamente pelo início (a abertura da festa, como sempre lhe chamámos) para aquilatar da dimensão do número de visitantes.

Todos os anos estava sempre mais gente que no ano anterior.

Assim pensávamos e assim acreditamos.

Talvez não seja assim. Não é assim garantidamente, mas que importa, se esse é o nosso forte desejo? A retribuição a que nos julgamos com direito.

Estão sempre mais.

E assim inebriados nos esquecíamos e esquecemos de quantos e tantos que ali não podiam e não podem estar. E quão injustos sempre fomos com tais esquecimentos.

No fundo, sempre pensámos que os que não estão, não estão porque não querem. Porque seria então?

Nos últimos anos, talvez porque cada vez são mais difíceis os encontros no meio da multidão, começámos a sentir – alguns – algumas faltas. Desencontros – porque à Festa vieram de certeza.

E seguimos.

E não paramos sequer para, por um momento, recordar o velho camarada – que sempre que as forças lho permitiram ali esteve connosco – e agora está sentado e triste no sítio onde tem de estar, amarguradamente a pensar em nós, em vós, os que estão na Festa.

E ele lembra-se dos nossos nomes, das tarefas que cada um de nós gostava de ter, dos que gostavam de lavar loiça, de descascar batatas, de varrer a esplanada, de ir com ele ao armazém, para os reabastecimentos.

Lembra-se também dos nossos problemas, daqueles que partilhámos então, e pergunta pelos nossos filhos, se estamos bem de saúde.

Ele, talvez as forças, ainda lhe dessem, mas não pode deixar a sua companheira de sempre, doente e impossibilitada.

Confidenciou há dias a uma amiga: nestes dias – antevésperas – em que habitualmente os camaradas partem para a Festa – nem vou buscar o jornal – peço a alguém que o faça.

Imagina o que me custa.

Se fosse à Festa – se pudesse ir à Festa – estava junto daqueles que sempre esteve ao longo da sua já longa vida.

Agora, que não pode ir – fica perto e cuidando de quem sempre o acompanhou.

Que os que estão, porque podem, se lembrem dele por um momento, um breve momento que seja.

E lhe mandem um abraço.

Ele ia gostar e não custa nada.

Também é um gesto «revolucionário».

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Deu na televisão

 

Creio que é por considerarem que pensar é a atividade de maior desgaste físico que a generalidade das pessoas remete essa tarefa para outros, enquanto para si reserva a adoção de pensamentos alheios.

E, não vamos agora esgotar-nos em trabalhosos pensamentos para procurar saber porquê, não temos dificuldades em encontrar, sem custos – pelo menos diretos - pensamentos para adotar.

Existem hoje, poderosíssimas máquinas de fabricação de pensamento, que disponibilizam o produto acabado de forma generosa e massiva.

E é produto de usar e deitar fora. Amanhã há novo.

Se o pensamento assim produzido ontem, hoje se verifica que os ingredientes de fabrico eram falsos – quase sempre são falsos – não faz mal, passamos à frente.

Não havia armas de destruição maciça? Ups… não faz mal. Mas podia haver!

O avião da Malásia não foi abatido por rebeldes russos (ou russos rebeldes?)? Ai é? Mas podia ter sido.

Afinal foi um agente secreto francês que abateu Kadhafi? Não foram lutadores pela liberdade na Líbia? Ora, pormenores…

Quem se esforça e pensa esse está mal.

Passa maus bocados. Porque se esforça por pensar por si próprio e porque recusa adotar o pensamento que lhe disponibilizam tão altruisticamente.

Se nós todos o fazemos, porque não faz ele também?

«Espertinho, tem a mania…» a dizer-nos que pode não ser assim.

Mas não pode ser assim, como, se deu na televisão e tudo?!

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

(des) Crenças

(

Os que acreditam que é possível haver um homem novo, que olhe para o outro vendo-se a si nele refletido, confrontam-se (têm que forçosamente se confrontar) inúmeras vezes, com a descrença no êxito desse processo.

E essas descrenças não surgem só por consequência das notícias de acontecimentos que nos parecem distantes, mas antes resultam de episódios mundanos, acontecimentos nos quais, direta ou indiretamente, intervimos.

Indicador preocupante, que nos mostra que talvez não estejamos a fazer aproximações mas pelo contrário afastamentos, obtemos quando fazemos uma passagem, mesmo que ligeira, pelos comentários que alguns fazem questão de «deixar» em jornais electrónicos ou em blogues.

É certo que a capa de anonimato – mais aparente do que real – estimula esses comportamentos, mas não explica por que carga de águas, alguns têm que os ter.

Mas o escrito que hoje aqui quero deixar prende-se com uma notícia ouvida e vista – foi expandida por televisão – há alguns dias.

Segundo o relato, uma médica de um hospital português, foi severamente agredida por um fulano, simplesmente pelo facto de ser portadora de notícia que não foi do seu agrado pleno.

A referida médica veio anunciar ao referido fulano que ele acabara de ser pai de uma menina.

Nem imaginava a médica que o bruto a iria sovar, simplesmente porque esperava que ela lhe viesse dizer que acabara de ser pai …de um menino.