sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Ai há, há!

 

Diz a senhora, dando seguimento a outras parvoíces de igual quilate, que há em Portugal, profissionais da pobreza.

Não sei por que carga de águas aqui estou escrevinhando sobre coisa destas. Nas paredes das casas de banho públicas e em alguns comentários em blogues encontro dislates semelhantes e daí não deriva a necessidade de sobre eles, dizer alguma coisa.

Esclareço então que não é a parvoíce assim expressa que me faz tomar posição mas sim o imperativo moral de, mesmo que desta forma muito modesta, procurar dar voz a quem negam até o sussurro.

E assim trago para aqui a voz da jovem cigana de bebé ao colo que batendo à porta nos pediu qualquer coisa onde pudesse aquecer o leite para o bebé pois estava a fazê-lo numa velha lata de salsichas.

O bebé (ano, ano e meio de idade) tinha uma cicatriz resultante da abertura do seu peito por força de uma cirurgia ao coração…

Trago também a do homem que se habituou a visitar-nos e a quem damos semanalmente umas moedas. Educado, triste e disponível para aceitar comida: “não precisa de ser dinheiro” disse-nos.

Um dia, tivemos mesmo que descer, pois ele sentiu-se mal e não teve forças para enfrentar as escadas. Talvez seja da fraqueza, disse.

Não sou muito dado a caridades, mas há situações em que não nos é possível o alheamento.

Não faço questão de referir outros episódios. Todos nós os temos para contar. Infelizmente.

O que faço questão de afirmar é que, nas mediáticas campanhas promovidas pela associação desta senhora eu não darei mais, nem um bago de arroz.

Com todo o respeito que me merecem os que precisam desesperadamente de alguns bagos de arroz.

Não precisei no passado de agir responsavelmente para com eles, não será agora, que irei deixar de cumprir com os imperativos da minha consciência.

Eu sei, todos sabemos, que não podemos olhar o fenómeno da pobreza sob uma perspectiva romântica.

Há muito sacana a servir-se dos pobres para proveito próprio, assim como muito sacana a produzir pobres por força da sua ganância.

Todos sabemos também, de há muito.

Sempre os refastelados da vida, ajoelhando e rezando, despejaram nos alforges dos pobres as migalhas das suas sobras – às vezes já bolorentas – tendo sempre oportunidade de despejar também, os seus doutos e cristãos “aconselhamentos”.

«Ai, deixe-se desta vida…,coitados dos meninos».

«Trabalho para o seu marido?! – Ai não, o senhor beltrano diz que o ano foi muito mau…»

É velha e mal cheirosa esta escola.

Há profissionais da pobreza em Portugal?

Há, pois há!

Bebem champanhe e acompanham com caviar, vestem fino e pintam-se. Aparecem na TV e fazem discursos de merda.

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