terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Tento na língua

O gaiato há muito que rondava as mesas. Tinha uma vontade enorme de se sentar ali, jogando a bisca com os homens.
Afinal ele já trabalhava com eles nos campos, porque raio não o deixariam estes, sentar-se ali e jogar uma cartada?
Quem sabe até, beber com eles um bagacinho.
Mas não. Era frequentemente corrido.
«Já o carapau tem tosse, não?!. Ainda agora tirou os cueiros e já quer sentar-se ao lado dos homens»
Passaram semanas, meses e ele sempre insistindo e sempre corrido.
Até que numa noite e sem que nada lhe indicasse tal desfecho, tendo o Ti Ze Francisco que sair mais cedo, recebeu o ansiado convite: «senta-te aí cachopo, vamos ver se ao menos conheces as cartas».
E eis que se senta, junto dos homens, pronto para a primeira suecada a sério, da sua vida. Não teve sequer tempo para apreciar o momento, o ritmo das jogadas exigia a sua máxima atenção.
Não podia deixar mal vistos aqueles que lhe tinham dado aquela possibilidade.
E lá foi, jogando. Com o andar da coisa, já batia as cartas como os homens - mesmo que à custa de fortes dores nas nozes dos dedos.
E foi com esse empenho que, sem se aperceber, pôs a mão sobre a brasa incandescente do  cigarro poisado na borda da mesa e num impulso, solta um estridente: «fo….-se».
Acto contínuo, o senhor João, o fumador, abocanha-lhe os colarinhos e grita-lhe: «Tento na língua menino…não penses que é por berrares malcriadices que te tornas homem respeitado…»

Lembrei-me desta história, quando  ouvi o senhor primeiro ministro, qual menino armado ao pingarelho, malcriadamente, chamar piegas aos portugueses.
Aos portugueses desempregados, aos portugueses a quem tira direitos, salários, a quem tira reformas, a quem aumenta desumanamente o preço dos transportes, dos bens alimentares, das taxas moderadoras.

E ao senhor primeiro ministro só me apetece dizer-lhe:
Tome tento na língua.

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